ouve
[ Ajuda-me a morrer devagarinho. Como se eu fosse só um peixe a resvalar de dentro da boca da água. Sem rasto e sem memória. Ajuda-me a morrer devagarinho antes de mim. Antes de todas as coisas ficarem pelo chão. Tira-me a pele para eu não sentir. Sorve-me o último neurónio para eu nunca mais pensar se dói ou já doeu, se não dói ou vai doer. Abre uma fenda ou um risco, qualquer coisa em mim, não importa. Qualquer coisa por onde se esvaia tudo aquilo que aqui está e ainda me cansa. Pode ser um lastro, um golpe, pode ser tudo mas não pode ser nada! E, sobretudo, (sobretudo!) leva embora tudo o que eu tenho de diferente, todas as coisas especiais que nunca pedi para ser, todas as coisas que me separam ou me ardem. Ajuda-me a morrer devagarinho, por favor. Porque só tu tens o segredo da exacta porção que me leva embora a vida e tudo o mais que se possa parecer com ela. ]
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